OS PRINCIPAIS “DEFEITOS JURÍDICOS” PROCESSUAIS

Conforme foi abordado na primeira parte desta obra, não resta qualquer dúvida que o Processo Administrativo Tributário, especialmente no âmbito do Estado de Mato Grosso, deve se pautar, necessariamente, pelos Princípios e postulados, tanto de natureza Constitucional, de natureza administrativa e de natureza processual. 

Considerando que o Contencioso Tributário é um dos maiores focos de litigiosidade na jurisdição brasileira, muito em função do fato de se “meter a mão” na parte mais sensível de qualquer cidadão, o bolso, mas também devido a obrigatoriedade do rito da execução fiscal para cobrança da dívida ativa, é necessária uma especial atenção por ambas as partes, que vem desde a constituição do crédito tributário até a decisão final de julgamento. 

Entretanto, revela-se extremamente corriqueira a identificação de vícios que maculam o processo administrativo tributário, comprometendo, por via de consequência jurídica, tanto a tramitação processual quanto os requisitos de liquidez e de certeza imprescindíveis à constituição do crédito tributário. 

No que se refere à tramitação processual, não há como passar batido por um tema antigo, mas que ainda gera muita polêmica nos Órgãos de Julgamento por atingir a substância do Crédito Tributário, que é a PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. Mas do que se trata? 

Apesar da celeuma semântica causada pela expressão, a essência é uma só: a Extinção do Crédito Tributário pelo decurso do prazo de julgamento durante o processo administrativo, ou seja, a inércia do Fisco. 

Pois bem, uma vez admitida a sua existência, a despeito de haver pelo menos duas correntes doutrinárias, entendemos que o Processo Administrativo Tributário poderia demorar mais do que o prazo previsto no artigo 174 do CTN, que é de 5 anos, desde que lhe fosse dado o devido andamento, sem necessidade do contribuinte estar sistematicamente peticionando para impulsionar a tramitação, todavia haveria prescrição intercorrente se ficasse parado injustificadamente por período excessivo. 

Essa conclusão é baseada nas seguintes premissas: 

  1. A movimentação do processo administrativo tributário é de responsabilidade da Fazenda Pública; 
  1. Se o PAT permanece inerte, o Sujeito Ativo é quem deve ser responsabilizado; 
  1. A sanção pela inércia do processo administrativo seria a extinção do Crédito Tributário. 

Ora, tendo o Sujeito Ativo, o ônus de agir, com fulcro nos Princípios da Oficialidade e da Celeridade, que objetiva a eficiência administrativa, neste caso, o andamento dos atos processuais, a clara demonstração, por decurso de prazo, de que a manifestação de vontade do Sujeito Ativo revela-se desinteressada no cumprimento do seu dever de ofício, possibilita ao Julgador, desde que provocado, a declaração da Prescrição intercorrente com base nos artigos 179 combinado com 173 e 190 do nosso Código Civil, que disciplina o fato jurídico de direito material. 

Invoca-se ainda, o instituto da segurança jurídica, uma vez que a prescrição intercorrente se faz necessária para manter a estabilidade das atividades mercantis do sujeito passivo, porquanto que as lides tributárias não podem se eternizar em detrimento dos interesses do contribuinte que fica submetido ainda, a juros e correção monetária, além do ônus da guarda de documentação e custos de honorários atrelados à tal discussão, sendo que quem deu causa à inércia foi o Estado. Existe, de fato, a rela necessidade de se por fim aos conflitos entre Fisco e contribuintes em prazo razoável, visto que ambas as partes “perdem” com esse marasmo. 

No que tange à situações de ordem material e formal, arriscamos a dizer que a maioria esmagadora desses vícios decorrem da inobservância aos requisitos do ato administrativo e desrespeito aos Princípios da PAT abordados na primeira parte, os quais estão previstos no artigo 2º da lei ordinária nº 8797/08 de MT. Senão vejamos, listamos algumas situações específicas a serem explanadas:  

  1. Falta de entrega ao contribuinte dos elementos que embasam o lançamento;  
  1. Inexistência de nexo entre o relato da infração, os dispositivos legais infringidos e a capitulação da multa;  
  1. Ausência de apreciação de todos os argumentos do contribuinte e da Fazenda pelo julgador tributário;  
  1. Impossibilidade de saneamento das omissões, inexatidões, incorreções e irregularidades pelo julgador tributário;  
  1. Decisões que extrapolam os limites do lançamento;  
  1. Violação ao princípio da não-cumulatividade no lançamento 
  1. (Im)possibilidade dos Julgadores Administrativos analisarem matéria Constitucional 
  1. Violação sigilo contribuinte (Será tratado em artigo apartado) 

Sendo assim, vamos ao debate: 

  1. Falta de Entrega ao Contribuinte dos Elementos que Embasam o Lançamento. 

Sabemos que o artigo 146, inciso III, alínea ‘b’, do Texto Constitucional de 1988, estabelece que cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre obrigação, crédito, prescrição, decadência e lançamento.  

No que concerne à constituição do crédito tributário, o artigo 142, do Código Tributário Nacional (CTN), aprovado pela Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, estipula que compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. O parágrafo único, do artigo 142, do referido diploma legal, dispõe que “a atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional”. Até aqui tudo bem! 

Entretanto, aprendemos, na primeira parte desta obra, que a autoridade administrativa somente poderá promover o lançamento de ofício, na hipótese em que a legislação contenha, de maneira clara, precisa e pormenorizada, todos os elementos atinentes à regra-matriz de incidência tributária, quais sejam: aspecto pessoal (sujeitos ativo e passivo), aspecto material, aspecto quantitativo (base de cálculo e alíquota), aspecto temporal e aspecto espacial. 

Ou seja, a Notificação de Auto de Infração (NAI) ou qualquer outro instrumento de lançamento previsto na Lei 7098/98 de MT deverá conter, de forma irrestrita e pormenorizada, todos os elementos inerentes à exigência fazendária, de forma que o contribuinte possa exercer sua defesa de forma ampla, observando os demais princípios aplicáveis ao processo administrativo tributário.  

O lançamento de ofício requer elementos imprescindíveis à configuração da obrigação tributária principal, sem os quais o mesmo não terá condições de prosperar, estando fadado à sua nulidade, por restar eivado de vício formal e/ou material. 

No âmbito do processo administrativo tributário do Estado de Mato Grosso, o Decreto Estadual n. 2.212 de 2014 (RICMS/MT), em seu artigo 961, §2º, prevê quais são os elementos que devem obrigatoriamente constar no Auto de Infração, a saber: 

 I – identificação da gerência e superintendência que o emitiram e respectivo endereço completo e telefones, com a indicação do local e do prazo em que poderá ser apresentada a impugnação pertinente; 

II –a qualificação do sujeito passivo da obrigação e respectivos responsáveis solidários; 

III – o local, a data, a hora da emissão e, se for o caso, a identificação do respectivo processo; 

IV – a descrição da matéria tributável com menção do fato gerador e respectivas base de cálculo e alíquota; 

V – o fundamento legal da exigência, a disposição legal infringida e a multa de mora aplicável em decorrência dos benefícios da espontaneidade, bem como a penalidade cabível pelo lançamento de ofício, na qual a multa de mora poderá ser convertida; 

VI – o valor original do tributo e a demonstração do crédito tributário total, ainda que na forma de anexo digital disponibilizado no sítio da Secretaria de Estado de Fazenda na internet, www.sefaz.mt.gov.br; 

VII – a consolidação do valor da exigência e a notificação para pagamento do crédito tributário lançado, com menção do prazo para recolhimento com os benefícios da espontaneidade; 

VIII – a notificação de que, uma vez não impugnado e não recolhido o débito, após decorrido o prazo para pagamento, a multa de mora será convertida em multa pelo lançamento de ofício, para fins de registro no Sistema Eletrônico de Conta Corrente Geral do Estado de Mato Grosso – CCG/SEFAZ e inscrição na dívida ativa tributária; 

IX – a impressão dos dados e cargo da pessoa responsável pela sua emissão, dispensada a assinatura e facultada a aposição de chancela mecânica; 

X – o número de verificação, para consulta eletrônica da autenticidade do instrumento, no sítio da Secretaria de Estado de Fazenda na internet, www.sefaz.mt.gov.br.  

Ressalta-se ainda, que o crédito tributário formalizado será processado com observância do disposto no artigo 960, devendo ser registrado, a débito, no Sistema Eletrônico de Conta Corrente Geral do Estado de Mato Grosso – CCG/SEFAZ, para controle do recolhimento da importância devida e da satisfação da respectiva obrigação. 

No entanto, não basta, apenas, que a Autoridade Fazendária (FTE ou ATE), ao promover o lançamento de ofício, observe o comando previsto no artigo 142, do Código Tributário Nacional (CTN), revela-se, também, imprescindível que o instrumento de lançamento seja devidamente instruído com os documentos, demonstrativos e demais elementos que comprovem a infração cometida pelo contribuinte, de forma que o autuado se encontre possibilitado ao exercício de sua ampla defesa, o que somente ocorrerá na hipótese em que se encontrar de posse irrestrita de todos os elementos que embasam o lançamento de ofício.  

Essa clareza é de suma importância, visto que a descrição do fato jurídico tributário relativo à situação infracional e à disposição legal infringida tem por finalidade demonstrar os elementos e as circunstâncias da obrigação tributária que não teriam sido observados, mediante o relato pormenorizado da infração imputada pelo Fisco ao contribuinte de forma que seja apontada a irregularidade cometida pelo contribuinte, bem como os dispositivos normativos infringidos, ressaltando que, em decorrência do princípio da legalidade, esta deverá guardar relação de pertinência ao dispositivo legal infringido pelo contribuinte autuado. Da mesma forma, a identificação do fato jurídico tributário caracterizador da infração, bem como do período compreendido no lançamento de ofício, caracterizam critérios limitadores aos institutos da Denúncia Espontânea, da Consulta Fiscal e da adesão a eventual a, Programa de Recuperação Fiscal (REFIS); 

Consideramos que a inobservância, pelo Fisco, do cumprimento dos requisitos em referência, inclusive pela falta de entrega ou, ainda, pela entrega parcial ao contribuinte autuado dos documentos, demonstrativos, provas, etc. que embasam o lançamento de ofício, resulta nulidade do próprio lançamento promovido, tendo em vista que desrespeitaria os princípios da legalidade, eficiência administrativa, contraditório, ampla defesa, devido processo legal, motivação, verdade material e segurança jurídica, conforme abordado no Capítulo I do presente livro. 

Aí vem aquela dúvida, mas como a SEFAZ entende desse assunto? Pois bem, a despeito do que foi exposto acima com base na doutrina majoritária, a SEFAZ tem se posicionado que tal lançamento pode ser convalidado, anulando apenas os atos processuais posteriores à sua lavratura. Ressalto a importância de se atentar aos prazos decadenciais, quando ocorrer a “reconstituição” crédito tributário e consequente “nova” notificação, reabrindo a contagem dos prazos.  

  1. Inexistência de Nexo entre o Relato da Infração, os Dispositivos Infringidos e a Capitulação da Multa 

Como foi citado acima, temos que segundo os comandos da Legislação tributária (RICMS/MT, artigo 961, §2º), esta estabelece os requisitos inerentes ao Instrumento de lançamento do crédito tributário, dentre os quais encontram-se: (i) a descrição do fato caracterizador da infração e das circunstâncias em que ocorreu; (ii) a indicação expressa da disposição normativa infringida; e (iii) a indicação do dispositivo normativo relativo à penalidade cabível. 

Nesse sentido, a descrição do fato praticado pelo contribuinte demonstra os motivos que culminaram no lançamento de ofício, estabelecendo o nexo entre as provas colacionadas pela autoridade fazendária em decorrência do procedimento de fiscalização realizado e a conclusão de sua verificação. Observamos que a descrição do fato que embasa a exigência fiscal deve ser relatada de forma clara, precisa e pormenorizada, de forma que não comporte dúvida acerca da relação lógica e jurídica entre os elementos da formação de sua convicção e decorrentes conclusões. 

A descrição do fato relativo à situação infracional imputada, acompanhada da menção precisa do dispositivo normativo infringido, objetiva demonstrar os elementos e as circunstâncias da obrigação tributária que não teriam sido observadas pelo contribuinte, advertindo que, em virtude do princípio da legalidade e da tipicidade, devem guardar, entre si, intrínseca relação de pertinência. 

Ademais, a indicação do dispositivo normativo relativo à penalidade cabível tem por finalidade demonstrar o enquadramento da situação fático-jurídica ao dispositivo infracional específico e legalmente previsto, pela circunstância de que o lançamento de ofício apresenta como pressuposto a prática de um ilícito de natureza tributária, em razão do descumprimento de determinado dever jurídico, cominando a aplicação da sanção respectiva.  

Portanto, em observância aos princípios da legalidade e da tipicidade, o lançamento de ofício deve, obrigatoriamente, conter todos os elementos essenciais à sua formação, mediante a descrição detalhada do fato, perfeitamente ajustada à hipótese legal de incidência e respectiva penalidade aplicável, ou seja, a exigência fazendária deve estar claramente enunciada para conhecimento do autuado, sob pena de decretação de sua nulidade, por caracterizar cerceamento do direito de defesa do contribuinte. 

A título de exemplo, se a infração cometida pelo Sujeito Passivo da “falta de recolhimento do ICMS”, a autoridade fiscal, ao descrever a aludida infração, jamais poderá capitular a multa cabível em dispositivo normativo que se refira à falta de entrega de livros fiscais ou “uso de crédito indevido” do imposto, por parte do Contribuinte. 

Do mesmo modo, entendemos que na circunstância do contribuinte ter recolhido determinado tributo em valor inferior ao apurado pela fiscalização tributária, em virtude de efetuar indevidas exclusões da respectiva base de cálculo, o relato da infração, os dispositivos infringidos e a multa aplicável não podem se referir à “falta de recolhimento do imposto”, mas tão-somente à hipótese de seu “recolhimento a menor”. 

Há ainda, que se observar o disposto na lei ordinária do ICMS, especificamente em MT, a Lei 7098/98, que traz as penalidades no artigo 45, entretanto há o disposto no §3º que impede a aplicação cumulativa de algumas multas, sob pena de se cometer um excesso de exação, senão vejamos: 

§ 3º Não se aplicará cumulativamente a penalidade a que se referem: 
I – as alíneas a e k do inciso I – nas hipóteses das alíneas a, b e d do inciso II; das alíneas a, b e d do inciso III; das alíneas a, b, c, h, i e k do inciso IV; e das alíneas e e n do inciso V; 

II – alínea a do inciso IV – nas hipóteses das alíneas a, b e d do inciso III; 

III – a alínea f do inciso IX – na hipótese da alínea h do inciso III. 

Em face das considerações alinhadas, é cediço concluir que o “Auto de Infração” deverá ser caracterizado como nulo, porque desrespeitaria os princípios da legalidade, contraditório, devido processo legal, eficiência administrativa e motivação, quando restarem evidenciadas, ao menos, uma das seguintes hipóteses descritas a seguir:  

  1. descrição errônea do fato caracterizador da infração e das respectivas circunstâncias em que teria ocorrido, inclusive por intermédio de omissões ao período compreendido, valores envolvidos e documentos fiscais considerados;  
  1. ausência de indicação expressa ou, ainda, indicação equivocada do dispositivo normativo considerado como infringido; 
  1. erro na determinação do comando normativo relativo à penalidade cabível;  
  1. ausência de relação lógica e jurídica entre (a) as provas que embasam a exigência fazendária; (b) a conclusão do procedimento de fiscalização; e (c) a descrição do fato caracterizador da infração; ou  
  1.  inexistência de relação de pertinência entre um ou mais dos seguintes requisitos do Auto de Infração, a saber: (a) o relato da infração; (b) os dispositivos normativos considerados como infringidos pelo contribuinte autuado; e (c) a indicação do comando normativo relativo à penalidade cabível.  
  1. Ausência de Apreciação de Todos os Argumentos do Contribuinte e da Fazenda pelo Julgador Tributário  

Conforme abordamos no capítulo dos Princípios que regem o PAT, o princípio da motivação compreende a circunstância de que os atos praticados no decorrer do processo administrativo tributário somente estarão aptos à produção de efeitos jurídicos, na hipótese de encontrarem-se efetivamente fundamentados, por intermédio da demonstração clara, precisa e detalhada, das suas razões.  

A esse respeito, o artigo 93, inciso X, da Constituição Federal de 1988, determina que “as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros”, usando esse comando Constitucional, por analogia, temos que As decisões proferidas no âmbito do processo administrativo tributário devem ser devidamente fundamentadas e motivadas, de maneira que o contribuinte e a Fazenda se encontrem aptos a procederem conforme sua disposição ou, ainda, confrontá-la, sob pena de decretação de nulidade, na medida em que devem ter plena segurança acerca da legalidade de seus atos e sobre a sua conseqüente proteção jurídica.  

Revela-se primordial, nesse sentido, a lição de José Eduardo Soares de Melo189, a saber: 

Conquanto a lide possa ser rica de fundamentos jurídicos, e encontrar-se amparada em farta documentação oferecida pelos litigantes, alguns julgadores singulares se têm pautado por comportamento lacunoso, utilizando-se o chavão seguinte: ‘analisadas as alegações do contribuinte, a manifestação do fisco e examinados os dispositivos regulamentares, julgo procedente o Auto de Infração’. Os tribunais administrativos nem sempre primam pelo exame rigoroso das alegações expendidas na lide, cingindo-se à mera manutenção (ou insubsistência) do julgado recorrido, deixando de adentrar no específico exame das questões suscitadas, omitindo a referência a documentos, valores, etc.  

A observância ao princípio da motivação no processo administrativo tributário, especialmente com relação às decisões proferidas, justifica-se pelas razões seguintes:  

  1. o julgador tributário, ao motivar sua decisão, demonstra que tomou conhecimento dos elementos constantes do processo (alegações apresentadas pelas partes litigantes, provas carreadas aos autos, etc.), apontando que a decisão proferida abordou, de forma irrestrita, todas as questões (fáticas e jurídicas) compreendidas nos autos;  
  1. como decorrência lógica do princípio da publicidade, a motivação permite que os atos praticados nos autos possam ser objeto de acompanhamento e de controle pelas partes litigantes de maneira geral; e  
  1. para que se torne possível a interposição de peças recursais, mostra-se relevante a motivação da decisão proferida, de forma a demonstrar os fundamentos dos recursos, legitimidade, interesse recursal e admissibilidade. 

Ou seja, o julgador tributário, ao deixar de apreciar, de forma específica e individualizada, todos os argumentos de natureza fática e de mérito trazidos ao processo administrativo tributário, tanto pelo Fisco quanto pelo contribuinte, incorrerá, em nosso sentir, em frontal desrespeito aos princípios da motivação, contraditório, ampla defesa e devido processo legal, cerceando o direito de defesa da parte prejudicada, culminando na nulidade da decisão. Nesse sentido, temos visto vários “Tribunais Administrativos” se manifestando pela anulação de decisões de 1º grau, sem a devida refutação. 

  1. Impossibilidade de Saneamento das Omissões, Inexatidões, Incorreções e Irregularidades pelo Julgador Tributário + Decisões que extrapolam os limites do Lançamento. 

As omissões, as inexatidões, as incorreções e as irregularidades contidas no lançamento de ofício, nos termos das respectivas legislações de regência, podem implicar as seguintes consequências processuais, a saber: 

Acerca do processo administrativo tributário do Estado de Mato Grosso ocorre que, enquanto não tiver ocorrido a decadência, o Julgador de primeira instância deve decidir e remeter os autos para unidade lançadora poder sanear os erros, promovendo um novo lançamento, cientificando-se o contribuinte autuado e devolvendo-lhe o prazo para apresentação de nova defesa ou para que promova o pagamento do débito fiscal com o desconto previsto em lei. Frise-se que essa “correção” NÃO pode ser feita pelo Órgão Julgador. 

Quando o processo estiver em fase final de julgamento no Conselho de Contribuintes, os erros de fato e os de capitulação da infração ou da penalidade não serão corrigidos pelo órgão colegiado, sendo causa decretação de nulidade, ainda que não arguido pela defesa, em razão da autotutela administrativa. 

Sucede-se que recentemente, foram acrescentados ao artigo 979 do RICMS/MT os §§ 20-A, B e C, que tratam das diligências e perícias, onde cabe ao servidor do fisco que efetuou o lançamento prestar as informações, proceder às retificações e juntar as provas requisitadas, pertinentes à ocorrência infracional, entretanto, do resultado da diligência ou da perícia será dada ciência ao sujeito passivo, assegurando-lhe, inclusive, pagamento do crédito tributário eventualmente retificado, quando for o caso, ou interposição de defesa. Encerrados os debates, serão tomados os demais votos, devendo a votação ser iniciada pelo relator e prosseguir segundo a representação dos conselheiros. 

Assim, considerando que o “Auto de Infração” caracteriza autêntico lançamento tributário vinculado, tendo em vista que devem atender aos comandos previstos no artigo 142, do Código Tributário Nacional (CTN), exprimindo total e irrestrita obediência à prévia e objetiva tipificação legal, parece-nos que as omissões, as inexatidões, as incorreções e as irregularidades contidas no Auto de Infração devem, necessariamente, pressupor o reconhecimento da nulidade do lançamento de ofício, sendo indubitavelmente necessária a lavratura de novo Auto de Infração, mas jamais na possibilidade de que o julgador tributário promova ou, ainda, determine seu respectivo saneamento.  

Consideramos que, na fase de julgamento, deve ser examinada, tão-somente, a legitimidade do lançamento de ofício decorrente da lavratura de Auto de Infração pela autoridade competente, especialmente no que tange à relação de pertinência entre seus respectivos elementos, a situação fática concreta atribuível ao sujeito passivo e o embasamento jurídico adotado, por meio da observância dos preceitos constitucionais e legalmente previstos.  

Não há que se confundirem as “funções administrativa/executiva” (lançamento de ofício por intermédio da lavratura do Auto de Infração; diligências e providências pertinentes à retificação do lançamento de ofício) com a “função de julgamento” (decisão acerca da legitimidade do lançamento de ofício), uma vez que nos parece juridicamente impertinente a competência para julgar e, ao mesmo tempo, para promover eventuais correções decorrentes do lançamento de ofício .  

Somos, portanto, do entendimento de que ao julgador tributário somente competiria a função de decidir a lide processual administrativa, adotando uma das seguintes medidas, a saber: (i) manter integralmente o lançamento de ofício; (ii) manter parcialmente o lançamento de ofício; (iii) cancelar ou decretar a insubsistência do lançamento de ofício; (iv) converter o julgamento em diligência; ou (v) determinar a realização de perícia.  

Entendemos, também, ser nula a decisão proferida pelo órgão de julgamento que inova os contornos do lançamento de ofício, em razão do inquestionável desrespeito aos princípios da legalidade, contraditório, ampla defesa, devido processo legal e motivação, implicando o seu cancelamento, para que outra nova decisão seja proferida, nos limites da matéria fático-jurídica contemplada nos autos. 

Em outras palavras, a competência do julgador tributário consiste, exclusivamente, em decidir a lide administrativa de natureza tributária, mas jamais promover ou determinar que sejam promovidas correções, alterações ou modificações no lançamento de ofício, decorrentes de omissões, inexatidões, incorreções ou irregularidades, na medida em que compreendem típicas providências atinentes ao próprio lançamento de ofício.  

Ou seja, a função administrativa de promover o lançamento do crédito tributário não se confunde com a atividade administrativa de julgamento do processo administrativo tributário.  

Portanto, reconhecemos que o julgador tributário não teria competência para promover a retificação das omissões, inexatidões, incorreções ou irregularidades contidas no lançamento de ofício, uma vez que referido ato administrativo compreende atividade privativa da autoridade lançadora competente, nos moldes do artigo 142, do Código Tributário Nacional (CTN), aprovado pela Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966; caso contrário, além de não atender a um dos requisitos essenciais de validade do ato administrativo (sujeito e competência), significaria desrespeito ao princípio da legalidade e da segurança jurídica. 

  1. Violação do Princípio da Não-cumulatividade no Lançamento. 

Conforme ensinado no capítulo inicial deste livro, no que se refere ao Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicações (ICMS), o Texto Constitucional de 1988, em seu artigo 155, parágrafo 2º, inciso I, determina que o gravame estadual “será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.  

Quanto o ICMS, as alíneas “a” e “b”, do inciso II, do parágrafo 2º, do artigo 155, da Carta Constitucional de 1988, advertem que “isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação (…) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes; acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores”.  

Dessa forma, o princípio da não-cumulatividade aplicável ao ICMS pressupõe, basicamente, a compensação de “créditos” com “débitos” do imposto, gerados em um determinado período de apuração (atualmente mensal), ou seja, o princípio da não-cumulatividade do ICMS é operacionalizado por intermédio da compensação dos créditos do imposto com débitos desse mesmo imposto, numa espécie de conta corrente fiscal gráfica. 

É patente que qualquer restrição ao aproveitamento dos créditos do ICMS, ou melhor, ao princípio constitucional da não-cumulatividade somente pode decorrer do próprio Texto Constitucional de 1988. Convém frisar que nem mesmo a lei complementar se encontra apta a criar obstáculos, empecilhos ou, ainda, vedações de matéria exaustivamente disciplinada pela Constituição Federal de 1988. 

Roque Antônio Carrazza (ICMS. 13ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009) adverte, nesse sentido, que, ao disciplinar o regime de compensação do ICMS, a lei complementar não poderá interferir no alcance e no conteúdo da não-cumulatividade, limitando-se a operacionalizar o sistema de escrituração do imposto (constituição, registro e crédito do ICMS), jamais sendo-lhe permitida a vedação a apropriação ao aproveitamento de créditos.  

Portanto, sustentamos que disciplinar a não-cumulatividade representa, tão somente, fixar os elementos necessários à operacionalização desse regime constitucional de compensação e abatimento dos valores tributários (documentos fiscais de apuração, alocação aos estabelecimentos do contribuinte, sistemática de transferências, etc.) 

Observamos que o contribuinte do ICMS operacionaliza a não-cumulatividade por intermédio da adoção do seguinte procedimento: (i) escritura as prestações e operações de aquisição no SPED (registro de entradas), creditando-se do respectivo valor do imposto incidente; (ii) registra as prestações e operações de saída no SPED (registro de saída); (iii) ao final do mês, transfere o somatório dos valores creditados e debitados para o registro de apuração; e (iv) informa ao Fisco o resultado do confronto entre os créditos e débitos do imposto, com a entrega da EFD. Na hipótese do valor dos débitos ser maior que o valor dos créditos no período mensal de apuração, em regra, o contribuinte apura imposto a recolher.  

Por outro lado, se, em decorrência do aludido confronto, o valor dos créditos for superior ao valor dos débitos, o contribuinte apurará saldo credor que será transferido e apurado no período mensal de apuração subseqüente.  

Mantidos referidos esclarecimentos, resta-nos saber se, diante da apuração de irregularidade à legislação tributária praticada pelo contribuinte, relativa (i) à falta de pagamento; (ii) ao recolhimento a menor; ou (iii) ao aproveitamento indevido de créditos dos impostos em referência, poderia a autoridade fazendária, nos termos do artigo 142, do Código Tributário Nacional (CTN), aprovado pela Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, promover o lançamento de ofício, por meio da lavratura do Auto de Infração, na hipótese em que o contribuinte apresenta saldo credor em sua escrituração fiscal.  

Entendemos não haver dúvida de que, se o Fisco comprova a prática de conduta irregular pelo contribuinte, resta configurada a infração à legislação tributária, sendo juridicamente descabida a determinação de causa de sua exclusão em virtude da existência de saldo credor na escrituração do contribuinte, uma vez que não encontramos na legislação de regência, comando normativo que permita eximir o contribuinte da prática infracional em face da circunstância de possuir saldo credor. Por outro lado, embora a autoridade fazendária tenha demonstrado a prática de conduta infracional, não nos parece possível, do ponto de vista lógico e jurídico, que seja promovido lançamento de ofício quando o contribuinte apura saldo credor em sua escrituração fiscal. 

Ainda que o contribuinte tenha (i) deixado de recolher o imposto; (ii) recolhido o imposto em quantia inferior àquela apontada pela fiscalização tributária; ou (iii) promovido o aproveitamento de créditos do imposto em hipóteses não previstas legalmente, considerando que apresenta saldo credor desse mesmo imposto, deveria ser conferida a possibilidade de promover a compensação dos referidos valores, numa espécie de “encontro de contas” entre (i) o valor devido que fora apurado pelo Fisco e (ii) o valor do saldo credor que possui em face do próprio Estado. 

Em outras palavras, a compensação tem por finalidade, apuradas as existências de créditos e débitos entre titulares distintos (credor e devedor), extinguir referidas obrigações (ativas e passivas) mediante o denominado “encontro de contas”. 

A despeito de ter sido criado uma sistemática de apuração do ICMS em MT através do regime de Estimativa, a “carga média”, entendemos que a identificação da prática de conduta infracional por contribuinte que apura saldo credor em sua escrituração fiscal não possibilitaria o lançamento de ofício pela autoridade administrativa, permitindo que o valor do imposto apurado pelo Fisco, ao invés de ser exigido por intermédio da lavratura de Auto de Infração (em que, inclusive, são exigidas as demais cominações legais), possa ser objeto de compensação com o valor do saldo credor existente.  

No entanto, caso a autoridade fazendária, ainda assim, promova o lançamento de ofício, sem considerar a existência de saldo credor e a possibilidade de sua compensação, entendemos que o Auto de Infração lavrado encontrar-se-ia maculado pela nulidade, pois desrespeitaria os princípios da legalidade, da eficiência administrativa, da proporcionalidade e interesse público, motivação e segurança jurídica. 

Finalizamos esse raciocínio concluindo que, é sabido que o PAT, apesar de extremamente necessário e relevante, visto que fundamenta-se, sinteticamente, nos aspectos seguintes: controle de legalidade do lançamento; verificação dos presumidos requisitos de liquidez e de certeza do crédito tributário; possibilidade do exercício da autotutela dos atos administrativos; respeito aos princípios do contraditório, ampla defesa, devido processo legal, legalidade, eficiência, interesse público, direito de petição, razoabilidade e duplicidade de instância; consubstanciando a indispensável segurança jurídica. É de se reconhecer que o PAT é uma das melhores saídas para o sério problema de “superlotação” do Judiciário. Todavia, tanto no Mato Grosso como na maioria dos Entes da federação, deixa muito a desejar em diversos aspectos, tanto sob a ótica do Fisco, como do contribuinte, no que os autores lançam, de forma voluntária, a título de contribuição, sugestões que poderiam dar mais eficácia e segurança jurídica à ambas as partes dessa relação tributária. 

  • Sugestões para melhoria do PAT  

1 – Aprovação de normas gerais e específicas para o PAT em consonância com o novo Código de Processo Civil (CPC); 

2 – Obrigatoriedade do PAT, antes da discussão judicial; 

3 – Penalidades pela Entrada de Embargos Declaratórios (pedidos de Esclarecimento) simplesmente protelatórios; 

4 – Possibilidade do Estado entrar no Judiciário, contra decisões que entenda, de forma fundamentada,  equivocadas; 

5 – Ampla discussão de todos os temas no PAT, inclusive a Constitucionalidade e ilegalidade da Legislação ordinária; 

6 – Dar ao PAT poderes de instância Jurisdicional Singular;  

7 -Das decisões finais do PAT, os recursos serem encaminhados ao Tribunais; 

8 – Transparência do Contencioso: Ampla divulgação das ementas com os julgados repetitivos, resguardando o sigilo fiscal do contribuinte;  

9 – Performance e eficiência: Prazo Médio não ultrapassar a um ano e máximo dois anos; 

10 – Composição de turmas, por especialidade de matéria, a fim de alinhar as decisões sobre os temas e dar celeridade e segurança aos julgamentos. 

11 – Critério de seleção do Presidente e julgadores (concurso interno de provas + títulos). 

Num próximo artigo, detalhamos, de forma esmiuçada, cada ítem da proposta de melhorias do PAT, ressaltando mais uma vez a tamanha importância deste instituto, para ambos os litigantes. 

Até a Próxima senhores operadores do Direito!